Quem
quer uma lasanha?
Domingo é
dia de comida mais caprichada, porque domingo é domingo.
E aí, a gente apela para uma massa mais
requintada, com molhos especiais, uma salada mais diversificada para combater
esse calor de 40 graus.
Felizmente, as cozinheiras não precisam
se estressar muito para preparar esses pratos. Há na cidade, tanta gente
habilitada que faz muitos pratos deliciosos e vêm prontos, ou no máximo
precisam de uma chegadinha ao forno para dar o ponto. E em alguns minutos, a
mesa é posta com pratos super-requintados e deliciosos para a alegria geral. É
claro que custa algum dinheiro, mas domingo é dia de se comer bem para
compensar o arroz, feijão e a abobrinha da semana.
Hoje está difícil de contentar o paladar
das pessoas. Elas comem coisas muito boas nos restaurantes e barzinhos que há
por aí, que às vezes rejeitam até uma lasanha.
Antigamente, domingo era dia de comer um
frango ao molho e uma macarronada. Era só isso. E era uma festa! E hoje dizem
que era o tempero da mamãe que fazia a diferença. Não é, não! A diferença estava no paladar de todos, que
estava acostumado só com o trivial, e no domingo se regalava com a macarronada.
Hoje o paladar está gasto, insensível e não se satisfaz com comidas simples. É
como se tivéssemos perdido o sentido do paladar, por termos degustado tantos
sabores diferentes.
Eu me lembro que, num dia de Natal fui
ao sítio e meus irmãos estavam colhendo milho. E era Natal! E não tínhamos o costume de comemorar esse
dia, porque o sistema era japonês, e se comemorava apenas a entrada do ano novo.
E os meninos precisavam colher o milho
que estava no ponto, porque o tempo ameaçava chuva. Com a chuva, as espigas
começariam a brotar... E perder-se-ia toda a safra.
Condoída com a vida dura dos irmãos, fui
ao milharal mais novo, colhi algumas espigas tenras e fiz frango caipira com
milho, temperado com tomatinhos que cresciam no quintal. Nunca mais esqueci a alegria deles comendo
arroz branco, com o frango e milho verde.
Eles degustaram com prazer, com satisfação. O paladar ainda não estava
estragado, e sabiam apreciar o verdadeiro sabor das comidas.
Hoje, há uma mistura de temperos nas
comidas, que as fazem perder a originalidade. Existe pizza com chocolate,
sorvete frito, sushi com manga... Tudo isso descaracteriza a culinária original,
e deixa os verdadeiros Mestres-cucas de cabelos em pé.
Mas, gosto é gosto, e cada um aprecia o
que lhe apetece.
Há gente que estranha o sashimi dos
japoneses, porque os filés de peixe são degustados crus. Mas, e os ocidentais
que consomem ostras vivas com limão?
Ostra me lembra lesma e me arrepia só de pensar em colocá-la na boca.
Mas, gosto é gosto e cada um come o que lhe apetece.
No começo dos tempos os ainos,
silvícolas do Japão, que viviam da caça e da pesca, ao caçarem um animal da
floresta, praticavam um ritual: a aldeia toda se reunia diante da caça e oravam
pedindo-lhe perdão pelo sacrifício de sua vida. Abriam o corpo do animal e,
repartiam o coração ainda quente entre todos, para que a sua energia passasse
aos humanos. E após dançarem em volta por um tempo, retalhavam o corpo que era
consumido cru, pois não conheciam o fogo ainda. Talvez o hábito de se consumir
o sashimi, ou peixe cru seja herança desses primórdios dos tempos.
E cada região consome o que a natureza
oferece com fartura. O Japão é uma ilha cercada pelo Oceano Pacífico. Então,
peixe é o que mais existe, além de outros frutos do mar como lagostas, lulas,
siris e camarões. O consumo desses seres é muito alto lá.
O Brasil por ser um país quase
continental, possui terras e terras para o plantio e criação de rebanhos, tanto
de caprinos, ovinos, bovinos e galináceos. Daí a fartura de carne por aqui, daí
a moda do churrasco, que nunca falta em festas... E também o excesso de
comilança, que reina por aqui, até entre os mais desfavorecidos.
Minha sogra era nascida na Ilha do
Havaí, embora de origem japonesa. Lá passou a infância e parte de sua mocidade.
E na aldeia onde morava, o costume era comer inhame como alimento básico, no
lugar do nosso arroz e feijão. E pesquisando sobre antigas civilizações,
descobri que as que moravam em ilhas, se alimentavam de inhame, porque é uma
planta que se desenvolve bem em lugares úmidos, e seus tubérculos possuem
muitos nutrientes.
Mas, voltando aos tempos atuais, dá para
se perceber como a culinária se sofisticou e há pratos que a maioria desconhece.
Todos os dias os mestres-cucas estão inventando novos temperos, novos molhos,
novas guarnições para acompanhar uma leitoa, um peru, um peixe...
Só que há pratos que perdem o sabor
verdadeiro, quando se acrescentam outros ingredientes. É o caso da feijoada. É
uma comida forte e nutritiva e não precisa de acréscimos, além dos pés de
porco, carne de sol e feijão. E a macarronada é deliciosa só com um bom molho.
Mesmo o arroz branco não precisa de
temperos diversificados, além do alho, cebola, óleo e sal. Conheço gente que
tempera feijão com pedaços de pimenta dedo de moça. Quem o consome fica com a
boca fervendo! E são esses ingredientes que vão destruindo o paladar, e às
vezes podem provocar doenças. Tenho um amigo que, está morrendo depois que teve
que extirpar os dentes e a língua, por doença. Todos os dias, oro para Deus ter
misericórdia dele. E como dói a alma só
de pensar no que ele está passando...
Comer, degustar, provar são prazeres que
a vida nos proporciona, Sem comer é impossível viver. Mas, é preciso comer com
moderação, porque o estômago é uma bolsa elástica, que absorve tudo. Depois
redistribui para todas as partes, inchando todo o corpo e transformando as
pessoas em monstros gigantescos, que não cabem em cadeiras, camas, sofás e nem
em carros.
Pra arrematar, vai uma lasanha aí?
Mirandópolis, fevereiro de 2014.