segunda-feira, 31 de dezembro de 2012


Oomisoka

De vez em quando, gosto de inserir aqui algumas palavras em japonês, porque não consigo atinar com uma que corresponda exatamente ao sentido que quero lhe conferir.
Oomisoka em japonês significa o último dia do ano, ou seja, se refere ao dia 31 de dezembro, o derradeiro dia do ano que finda. Para os japoneses, essa data tem um significado muito mais profundo do que apenas mais um dia no calendário.
 No Brasil e nas civilizações ocidentais, é costume considerar o dia 25 de dezembro como a data máxima de comemorações de fim de ano. Tem a ver com a cristandade, com o nascimento de Jesus, o Salvador do Mundo. Então, em dezembro tudo gira em torno dessa data: organizam-se reuniões de famílias, de amigos, de colegas de trabalho, de vizinhos para as confraternizações e troca de mimos; as compras de dezembro são todas visando as Ceias de Natal e os presentes a serem trocados.
É presente para os afilhados, os netos, os amigos secretos...  Ainda tem as nozes, as castanhas, as passas, os vinhos, os champanhes. E os perus, as leitoas, os chesters, o arroz de festa, os panetones, a sobremesa especial, as frutas tropicais... E sem contar com os trajes de gala... O 13º salário se torna pequeno e irrisório diante de tantos gastos.

Entretanto, para os japoneses de cultura milenar de antes de Cristo, o costume é bem diferente.
Durante o mês de dezembro é costume se fazer a faxina da casa, da despensa, dos armários e do quintal, eliminando tudo que é inútil e desnecessário. (É o grande osouji, ou faxina geral). Por que isso? Para pôr em ordem a vida de todos da casa, para se iniciar o novo ano sem as quinquilharias e os bagulhos, que atrapalharam durante o ano todo. Para iniciar o novo ano de alma limpa, de casa limpa, com outras aspirações.Nesse mês também se acerta as contas, devolvendo o que foi emprestado, pagando o que é devido e agradecendo os favores recebidos. É costume, pois, visitar os amigos com um mimo para lhes retribuir a atenção recebida durante o ano, e dentre outras palavras dizer também que, no próximo ano se espera contar com a sua amizade e atenção. (Yoroshiku onegai itashimassu)

E no dia 31, o dia do Oomisoka, a família se reúne para a confraternização, com um grande banquete, onde não falta também o “omoti” um bolinho de arroz, que nos tempos difíceis do Japão era considerado “alimento dos deuses” e era ofertado só aos monges dos templos. Esse banquete tem o propósito de agradecer as graças recebidas de Deus ou Buda durante o ano, pela boa colheita, pela aprovação do filho no Vestibular, pelo emprego garantido, pela saúde de toda a família.
E também, tem a ver com a vida, pois o calendário que se encerra é considerado como a vida que se vai. Então, é preciso fazer uma retrospectiva da própria vida e eliminar tudo que atrapalhou, para que na nova etapa haja menos erros e mais acertos. E nada de carregar para o novo ano as dívidas, as coisas pendentes, para que tudo transcorra melhor, sem compromissos atrasados, sem aflições.
É justamente essa parte de propósitos que assimilo de coração. Acho que os meus ancestrais foram de uma sabedoria ímpar – aproveitar a virada do ano para reflexões, para sanar os estrangulamentos, os erros. E começar uma nova etapa com outros propósitos, com outras intenções. Não só festejar, mas agradecer as graças recebidas e programar a continuidade da vida, para crescer sempre. Agradecer tudo de bom que aconteceu e, outrossim, agradecer tudo de ruim que foi superado. Etapa vencida para iniciar nova etapa.
Então, não há comemoração no primeiro dia do novo ano?
Há, sim! Nesse dia costuma-se receber os amigos, os vizinhos para agradecer a boa vizinhança, a boa amizade, a confiança, a  atenção recebida durante todo o tempo do ano que finda.
Resumindo tudo, talvez haja semelhanças nas comemorações ocidentais e orientais, porque os cristãos também agradecem a Deus as graças recebidas, e pedem a proteção de Jesus e Maria para o novo ano que logo se inicia.
Mas, percebo que ultimamente o que mais predomina nessas festas é só futilidade. As pessoas se preocupam mais com a decoração da casa, da mesa, com as iguarias a servir, com as roupas da moda e se esquecem do fundamental que é agradecer a Deus a família que está inteira, agradecer a saúde que lhes permite ainda saborear uma boa ceia, agradecer o emprego que lhes possibilita sobreviver e, agradecer a presença de amigos, que ainda estão aqui na terra para tornar a vida mais leve e agradável.
Tanto nas reuniões de japoneses como de ocidentais, hoje a preocupação é só consumir: comer, comer, e beber, beber...
E nada mais impróprio do que comer demais nesse verão bravo, com esse calorão insuportável.
Comer comida forte e gorda, beber em exce sso pode levar os alegres celebrantes para a última comemoração de suas vidas.
Então, é bom se cuidar se quiser vencer o Oomisoka e chegar a 2013, com alegria.
E boas festas para todos!        
Com moderação.

Mirandópolis, dezembro de 2012.
kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”





segunda-feira, 24 de dezembro de 2012


Para que servem 
as dores?


Ultimamente, tenho ouvido muita gente reclamar de dores.
São dores de cabeça, de coluna, nos joelhos, nos ombros, nas pernas... que não dão trégua.
Também há as dores internas de fígado, de estômago, da garganta, dos ouvidos, nos intestinos...
Interessante é que eu não tinha atentado para esse fato, até que comecei a sentir dores num dos joelhos. É que até agora, eu não sabia o que era dor física intermitente, que judia das pessoas.
Ao procurar ajuda de especialistas, constatei que a dor é um problema muito comum e que atinge a maioria das pessoas. E pensar que vivi setenta anos sem saber o que era dor física. Bem, dores da alma, não há como esquivar delas...
Descobri que, jovens que crescem de repente também sofrem de dores, porque os ossos crescem e os nervos são incapazes de acompanhar essa velocidade de estiramento. E os nervos curtos tolhem os movimentos nas articulações, provocando dores lancinantes.
Sei de amigos que andam duros, rígidos, com extremo cuidado, porque sua coluna travada não lhes permite curvar-se, sem sentir dores. Os que sofrem de dor na coluna são a maioria dos doloridos.
Outros têm tantas dores nos joelhos, na batata da perna, nos tornozelos ou nos pés, que estão sempre indispostos para dar um passo. Tudo é muito dificultoso, e então vivem desolados, porque seu raio de ação vai ficando cada vez mais limitado.
Dores de estômago e dores de fígado que, não permitem alimentar-se direito, deixam as pessoas sempre mal humoradas e tristes. Mesmo porque, comer e sentir o sabor de certos alimentos é uma das raras alegrias desta vida.
Mas, há os que têm dores nas pernas e caminham mesmo assim, puxando uma delas, arrastando-a, saltando, escorregando... vão aonde precisam ir, com muita dificuldade, ainda mais porque as calçadas de nossas ruas  complicam bastante sua locomoção. Duro mesmo é não poder ir aonde se quer, para resolver os problemas que surgem e, precisam ser resolvidos pessoalmente. Então, é preciso caminhar, e muitas vezes as pernas não ajudam. Muita gente ainda teima em ir e só piora suas condições.
Nos consultórios médicos, e nos Hospitais há dezenas de pessoas reclamando de dores. E invariavelmente, são dores na coluna vertebral e nas pernas. Todas são histórias semelhantes: excesso de peso nas costas sobrecarregando as próprias vértebras, por anos seguidos de trabalho duro e exaustivo, ou desgaste dos ossos das pernas.
Já há um tempo atrás,  eu havia percebido como as pessoas sofrem de problemas nas pernas e até escrevi uma crônica intitulada “Pernas”, publicada nesse mesmo blog, em dezembro de 2011.
Nessa crônica abordei a questão do peso corporal, que inicialmente estava distribuído sobre quatro patas nos primeiros hominídeos, e que passou a sobrecarregar as duas patas traseiras, quando eles se tornaram eretos, assumindo a postura do homem atual.
Se realmente, como a Ciência e a Antropologia preconizam que o homem era de verdade um quadrúmano, acho que a ereção da humanidade foi um desastroso engano.

Hoje, vendo toda a humanidade sofrendo de dores na coluna vertebral, nas pernas, nos joelhos e nos pés, não há como não pensar nisso. Basta imaginar o seu cachorrinho de estimação sendo obrigado a andar só com as patas traseiras. É forçar a natureza, é maltratar das partes que terão que carregar todo o peso, que é proporcionalmente distribuído sobre as quatro patas. Querem uma suposição mais dura? Imaginem um cavalo andando só com duas patas e na posição vertical.
      Pois é. Acho que foi exatamente isso que ocorreu quando o homem levantou a espinha dorsal e ficou na posição vertical, usando as pernas para se equilibrar. Quando um bebê humano começa se locomover “anda de gatinhas”, como os bichinhos e quando dá seus primeiros passos, percebe-se a grande dificuldade, em comparação com os gatinhos bebê, os cachorrinhos bebê, que já saem cabriolando logo de início.
Não estou pregando que a humanidade volte a andar sobre as quatro patas, como no início de sua história. Mas, acho que existe alguma relação da dor do homem moderno com a história de sua verticalidade. Ah! Isso tem, com certeza.
Se não, por que  os humanos sofrem tantas dores?
E para que servem as mesmas?


      Mirandópolis, dezembro de 2012.
      kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012



13º Salário



No princípio dos tempos era cada um por si. Cada ser humano, meio gente, meio bicho procurava o que comer para matar a fome no meio da selva, onde vivia.
É claro que as frutas eram o seu objetivo maior, porque estavam disponíveis e fáceis de colher. Mas, a necessidade orgânica fê-lo procurar por outras fontes, como ostras, peixes e pequenos animais, porque sentia falta de proteínas.
      Daí, o homem passou a ser caçador e pescador. Restos de civilizações antigas comprovam como o homem consumiu ostras em profusão, e por onde passou deixou cemitérios desses bichos. Ainda hoje existem tribos nas profundezas das imensas florestas do mundo, que vivem da caça e da pesca. Mesmo no Brasil, ainda há tribos que não têm contato com outras civilizações e vivem dos produtos colhidos na selva.
Conheci há uns anos atrás, certo pedreiro que havia trabalhado  em Mato Grosso do Sul por meses e meses, construindo a sede de uma fazenda. Muitos índios da redondeza trabalharam na obra. E esses índios programaram um churrasco no final da construção. Disseram que iam caçar sempre, para reservar a carne para a festa. E o pedreiro começou a ficar encucado, pois os índios não dispunham de geladeira...
Quando chegou o dia, ele foi ao local da festa e descobriu que realmente, os amigos haviam caçado muitos bichos, como tatus, capivaras e macacos, que estavam dentro de um enorme cocho para ser assado. Mas, ele ficou bastante incomodado porque, as carnes estavam conservadas em mel, puro mel de abelha, sem sal. E ele não conseguiu comer aquelas carnes...

Assim são as diferentes civilizações.
Mas, toda a humanidade tem como prioridade a comida. E por ela, todos batalham, pelejam, suam, se empenham pra valer. Se não comer, morre. É preciso comer, e dar de comer à prole. Então, o jeito é aguentar o tranco e passar a vida toda trabalhando, para garantir as provisões da família.
Por séculos e séculos, a humanidade procurou saciar a fome com o suor de seu trabalho, plantando e colhendo os frutos de suas plantações. A sociedade era essencialmente agrícola. Mesmo os mais primitivos cultivavam inhames e milho, que lhes garantia o básico do dia a dia.
Em 1760 com a Revolução Industrial na Inglaterra, o homem começou a perder terreno para as máquinas, que passaram a produzir objetos de consumo em série, nas linhas de montagem. E a sociedade rural se transformou em urbana, com o êxodo, inchando as cidades. E da noite para o dia, formou-se um exército de mão de obra excedente, que fez despencar o salário dos trabalhadores.
Era o advento do Capitalismo.
Até meados de 1800, a jornada de trabalho era de 12 a 16 horas por dia, incluindo mulheres e crianças.
Isso incomodava tanto que, o Papa Leão XIII na Encíclica “Rerum Novarum” de 1891 aconselhou aos dirigentes da sociedade que “a jornada não excedesse a força do trabalhador, e lhe garantisse repouso proporcional ao tempo dedicado ao trabalho.”
Mas, demorou muito para se por em prática tal medida, justamente porque havia sempre muitos operários disponíveis sobrando, que poderiam ser explorados. O Capitalismo traz no seu bojo essa tragédia para o trabalhador: a concorrência de mão de obra, que hoje se estende até para a mão de obra especializada, tornando-a barata e descartável.
  As condições de exploração no trabalho eram tão terríveis que, em 8 de março de 1857 em Nova Iorque, 129 operárias corajosas iniciaram um movimento, reivindicando licença-maternidade, redução de jornada de trabalho de 16 para 10 horas, e igualdade de salário para mulheres que exerciam a mesma função dos homens (elas recebiam um terço apenas). Em represália, foram confinadas no prédio da fábrica têxtil, onde trabalhavam e foram queimadas.
Em homenagem a essas heroínas, foi instituído o Dia Internacional da Mulher, que é comemorado no mundo todo no dia 8 de março.
Em 1917 na Rússia, outras mulheres operárias da indústria têxtil iniciaram um imenso protesto contra a fome, que assolava o país, e contra a Guerra. Isso foi o estopim para a Revolução Russa de 1917. Essa Revolução derrubou o governo absolutista do Czar Nicolau II, e mais tarde deu origem à União Soviética, o 1º país socialista do mundo.
A mulher no trabalho conseguiu melhorar as condições dos operários, mesmo à custa de autoimolação em prol da sociedade. E de lá para cá, muita coisa mudou. Licença-maternidade, licença-saúde, direito à hora de amamentação, licença paterna para cuidar da esposa e do bebê recém- nascido, licença-prêmio, aposentadoria especial para as mulheres, aposentadoria por tempo de serviço... E o 13º salário.
O décimo terceiro salário foi concedido como uma premiação ao trabalhador que cumprisse os doze meses de obrigações no ano. Na verdade, não é prêmio, não! É a compensação irrisória pelo salário mal pago pelo patrão, pela empresa, pelo salário que é reduzido mesmo.
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O agente que manda, ou seja, o patrão, o senhor, o feitor e o governo nunca, nunca concedem um benefício que é direito do trabalhador, sem que este lhes peça, lhes requeira, lhes solicite. Se o trabalhador não solicitar e não gritar seus direitos, os que mandam nele jamais perceberão as suas necessidades. As empresas acumulam lucros imensos à custa do suor e dedicação do operariado. Mesmo concedendo os direitos reivindicados pelos manifestantes, elas não quebram. A prova mais contundente disso são as vitórias obtidas através de campanhas salariais e ou greves.
Mesmo sendo pequeno, o 13º salário alivia (e como!) a vida do trabalhador, pendurado em dívidas. A maioria consegue com sacrifícios acertar suas contas no final de ano, para começar tudo de novo.
E a partir de novembro, todo o comércio é invadido por consumidores, que durante o ano todo sonharam adquirir algo novo, e que só o 13º salário lhes possibilitou comprar.
E é agradável ver as pessoas realizando seus sonhos, que antigamente eram somente de crianças. Hoje, os adultos compram carros novos, reformam suas casas, trocam os computadores, a televisão, adquirem terrenos para construir a casa própria. E sempre com a ajudazinha do 13º, que vem engordar as poupanças feitas com sacrifício, ao longo dos meses...
Fico conjeturando na possibilidade de a humanidade um dia despertar e, proporcionar mais benefícios à população, com um salário justo, com respeito e cuidados para todos viverem melhor.
Deixariam de existir a classe dos opulentos, que tudo têm e a classe dos descamisados, dos famintos.
Haveria apenas uma classe de gente trabalhadora, que em conjunto com as empresas, produziriam o que é necessário e dividiriam os benefícios, de forma que não haveria os insatisfeitos, os revoltados, os explorados.
Se a humanidade tem cérebro para pensar, um dia tem que chegar à conclusão que, a harmonia do conviver só será possível quando houver o reconhecimento do que é justo e, que a divisão equitativa dos benefícios só trará vantagens para toda a sociedade.
Acabariam as guerras, as revoltas, as greves, os assaltos, as agressões físicas, a insegurança...
Será que algum dia isso acontecerá?
Ou será apenas uma utopia?

Mirandópolis, dezembro de 2012.

kimie oku 
in“cronicasdekimie.blogspot.com”


terça-feira, 18 de dezembro de 2012



Ceia de Natal




Nos anos 80, participei de uma Ceia de Natal, que me deixou desolada.
Eram os anos de ouro do Banco do Brasil, havia dezenas de funcionários e festas eram em todos os finais de semana. Churrasco já era carne de vaca.
Pois bem, naquele ano alguém teve a idéia de fazer uma Ceia de Natal.
Como muitos dos funcionários iriam viajar para ver seus parentes, só uma dúzia de famílias aderiu à idéia. E aí, foi uma azáfama para organizar o jantar.
Depois de muito discutir, resolveram fazer a reunião na casa de um dos amigos que tinha um quintal grande, para se organizar a mesa para todos se assentarem. E os homens fizeram as compras: uma dúzia de frangos, um peru imenso, uma leitoa e bebida farta. E as habilidades culinárias das mulheres entraram em ação: fazendo farofa salgada e doce, o molho, os cremes, o arroz de festa, a salada de legumes com molho de maionese (era moda comer salada de maionese). Tudo feito em casa, que naqueles tempos era assim que se fazia.
E o pessoal da decoração houve por bem determinar que os pratos deveriam ser de Nadir Figueiredo, que havia lançado naquela época os pratos de vidro temperado, da cor de mel.
Chegando o dia, todas as famílias participantes foram à casa do amigo. Ajudamos a organizar tudo, a mesa, as toalhas brancas, os pratos todos iguais, os talheres que cada grupo levou, as guarnições da ceia.
E alguém chegou e colocou música natalina no aparelho de som. E o dingobells e a noite feliz tocaram até a gente ficar enjoada.
Quando a mesa estava pronta, mas sem as carnes, que só chegariam mais tarde da padaria, onde estavam sendo assadas, o chefe da festa chegou e começou a comandar todo mundo. Disse que a ceia seria exatamente à meia noite, e ainda faltavam duas horas. Duas horas!
 Havia seguramente umas quarenta crianças, pois cada família tinha de três a quatro crianças de cinco a doze anos. Enquanto havia pique, os meninos correram e suaram tudo que tinham direito. Depois, o sono veio chegando junto com a fome. E o organizador fazendo discursos...
Aí, alguém teve a idéia de ligar a tevê. Era show de fim de ano do Roberto Carlos. Um de meus filhos gostava de ver esse programa, mas nessa noite nem o Roberto conseguiu despertar os meninos do sono, do cansaço e da fome. Uns e outros se recostaram no sofá ou no chão mesmo, e dormiram. Dormiram a sono solto, por mais de uma hora...
Nessa altura do campeonato, meus filhos queriam ir embora: “Vam’bora, mãe! Tou com sono! Vam’bora, pai! Tou com fome!”
E aí, o chefe nos convocou para a ceia. Todos saíram meio cambaleando de sono e de fome.
Quando todo mundo pensava em destrinchar os frangos, os perus e a leitoa, que estavam dourados no centro da mesa, o homem resolveu ler a Bíblia. Não me lembro do texto que leu, e das orações que fez, mas foi chato prá caramba, porque naquele momento não cabia mais nada. A paciência já era.
Enfim, quando deram o sinal de atacar, os meninos pegaram cada um uma coxa de frango e saíram comendo.
Aí, eu senti o cheiro. Cheiro de coisa podre. Dei o alerta.
Cada mãe começou, num frenesi, a tomar os pratos dos filhos e conferir as carnes. Os frangos estavam estragados e cheirando mal. Os meninos com tanta fome nem perceberam nada. Foi simplesmente desagradável. Doze frangos  crocantes estragados, que foram pro lixo...
Por sorte, o peru estava normal assim como a leitoa. Mas, a maioria nem conseguiu comer carnes depois da cena dos frangos. O cheiro ficou no ar.
Por que se estragaram os frangos?
É que ninguém possuía freezer, e os frangos temperados de véspera ficaram azedando nas temperaturas altíssimas do verão de dezembro. Fora da geladeira...
Depois disso, nunca mais participei de Ceias de Natal.
Ficou na minha lembrança, a imagem confusa dos meninos sonolentos e famintos, misturada à imagem de um homem obsessivo que, insistia em fazer uma pregação no meio da noite, quando todos só queriam ir para casa dormir.
Foi a Ceia de Natal mais deprimente que participei.
E nunca mais caí em outra.
  
Mirandópolis, dezembro de 2012.
Kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012


Balanço Geral



           Quando chega o fim de mais um ano, é preciso fazer um balanço do tempo que passou.
O que foi realizado, o que deixou de ser, as pequenas realizações do dia a dia e as grandes derrotas que prevaleceram...
Todos nós empenhamos valentemente para alcançar metas, mas as dificuldades sempre atrapalham e poucas são as vitórias.
Mas,  olhando ao redor, percebemos como a vida foi generosa com a gente. Famílias perderam pessoas muito queridas, doenças atingiram amigos de repente, problemas financeiros atrapalharam a harmonia de alguns lares... Separações desfizeram famílias de longa data, arrasando os filhos, os netos...
Tá certo, houve alguns entraves, mas é assim mesmo. Não existe caminho sem pedras prá tropeçar, ou espinhos para ferir. Mesmo assim, chutamos as pedras, lambemos as feridas e continuamos a caminhada, sem maiores problemas. Com algumas dores, é verdade.
E chegamos até aqui inteiros, com toda a família. Com rusgas aqui e ali, mas nada que o tempo não resolva.
O importante é que ainda estamos aqui, participando da grande aventura de viver.
Problemas? Quem não os tem?
Problemas de saúde: uma vertigem aqui, outra ali, uma dor na coluna, dando uma entortada de vez em quando, dor no joelhos, dificultando a caminhada... visão meio desfocada, aumentando os graus dos óculos... ouvidos menos auditivos, perdendo a metade das falas alheias, cabelos embranquecendo o dobro do ano passado (os que não caíram ainda), a memória traindo volta e meia, olvidando  os nomes de amigos, que de repente nos abraçam com alegria no meio da rua... perdendo os óculos dentro de casa, esquecendo a chave do carro nas lojas, sem contar as bolsas e carteiras esquecidas por aí... e o colesterol aumentando, assim como o peso...
Puxa! Quantos problemas a gente enfrenta nessa fase da vida. Acho que não são problemas, mas motivos que conduzem ao final. E como a gente teima em viver, vai tentando vencer tudo isso, para não entregar os pontos. Resistir é preciso.
Na verdade, a gente está descendo a rampa.
E é uma rampa vertiginosa, cheia de acidentes que  derrubam a gente, que nos fazem tropeçar, cair, e cair, e cair... Difícil é levantar, porque não há corrimão para nos apoiar, e quando a gente consegue, devido ao ângulo íngreme da descida, a gente cai de novo, de novo, e de novo. E vai rolando para baixo, mais para baixo... Mesmo assim, a gente ainda quer caminhar com as próprias pernas e chegar até o limiar da vida, com coragem e determinação. Resistir é mais do que preciso.
Então, toma-se o remédio que é só um paliativo, faz-se um regimezinho, caminha um pouquinho, e assim a gente vai enganando a si mesmo, como se levasse uma vida cheia de firmes propósitos, e fingindo que tudo está azul.
Enquanto isso, repassamos mil vezes o ano que findou, a vida que  está passando, tudo que se viveu, sofreu, aprendeu...
O que fiz nesses 365 dias?
Respirei, comi, dormi, falei, escrevi, telefonei, caminhei, abracei amigos, cantei e brinquei várias vezes de ciranda, descobri amigos para o grupo Ciranda, que se reuniu onze vezes na Chácara do seu Albertino Prando, e nos divertimos tardes inteiras, embalados pela sanfona e pelo pandeiro, fiz bolos e tortas pros cirandeiros.
Troquei o computa, fiz curso para aprender o básico para digitar meus textos, fotografei (como fotografei!), entrei no face book, postei fotos, comuniquei com gente que nunca vi, mas que está sempre em sintonia comigo, descobri o paradeiro de pessoas queridas, que há séculos não via.
Fui ao sítio, plantei legumes e verduras, arranquei ervas daninhas, irriguei canteiros, colhi salsas, cebolinhas, cenouras, pimentões, tomates, berinjelas, pimentas ardidas, beterrabas... limões, jacas, mangas Bourbon, espada.... Distribuí legumes frescos e frutas pela vizinhança.
Entrevistei pessoas, tanta gente bonita que são exemplos de vida... dona Severina, Takeshi Kido, Waldir José Frigeri, Neyde  Pavesi, Gennaro Ordine, Fernando Miron,  José Carrilho Viudes, Ivo Ferreira... que nos encantaram com suas experiências de vida, dedicadas à construção dessa nossa cidade.
Vi médicos, tomei remédios, fiz sessões de fisio, tratei dos olhos, pinguei colírios, troquei os óculos, cuidei da alergia epidérmica, com cremes e loções caras, caminhei, tentei regimes... acho que tudo em vão, pois a idade não perdoa e o peso dos anos vai cobrando os juros...
Comprei livros japoneses sobre os heróis Oda Nobunaga, Tokugawa Ieyassu, e Toyotomi Hideyoshi, li e copiei a biografia de Miyazawa Kenji e Higuchi Ichiyo. Encomendei as biografias de Noguchi Hideyo, Sakamoto Riyoma, e Takeda Shingen.
Ufa! Não foi mole, não!
E ainda toquei piano. Muito barbeira e desafinadamente, mas toquei. Para não esquecer o dedilhado, e para eu curtir a sonoridade das serenatas e sonatas dos grandes músicos. (Toco para mim mesma, por isso não fico preocupada se acabo cometendo grandes deslizes).
De tudo o que lucrei?
As leituras, os filmes que vi, os textos japoneses que copiei, as crônicas que fiz. Posso dizer que vivi plenamente este ano de 2012.
E amanhã, como será?
Como será 2013?
Bem, o porvir só a Deus pertence.
         Viver é preciso. Agora.

Mirandópolis, dezembro de 2012.
kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012


Memórias de dona Severina

Severina é uma menina que nasceu em 1921 em Jacobina na Bahia, filha de pais pernambucanos. Sua mãe chamava-se dona Ernestina Barbosa de Luna e seu pai Misael Leandro Alves, cujo nome ficou eternizado numa das ruas da cidade de Mirandópolis. Seu Misael foi o primeiro barbeiro daqui. 
 Seus pais eram meio nômades, mudando-se de um lugar para outro, em busca de trabalho e melhor lugar para se morar. Assim, quando a Severina tinha mais ou menos cinco anos de idade, mudaram-se para a cidade de Cedro no Ceará, e logo depois para Bodocó, perto de Nova Exu, em Pernambuco.
Em Bodocó, Severina estudou um pouco com a Professora dona Videlina, com quem iniciou a alfabetização.
Quando Severina tinha onze anos, a família se emigrou para o Estado de São Paulo, vindo a fixar-se na Fazenda Pio Prado, na região de Araçatuba. Ali foram colonos de café, e Severina aprendeu a derriçar e abanar os grãos dos cafezais. Tarefa difícil demais, mais ainda para uma menina adolescente.                                          
Dez meses depois, mudaram-se para a Fazenda Santa Helena, em Aguapeí, município de Valparaíso, também para se dedicar à lavoura de café. Em Aguapeí, estudou um pouco mais com a professora Nicácia. Nessa época, o pai Misael cortava os cabelos de todos os membros da família e, ensinava a leitura para quem quisesse aprender. Mas, para a Severina, escola foi só até aí, com a professora Nicácia. E ela aprendeu a ler e a escrever.
                                        Em 1935, vieram para Mirandópolis.
Aqui era tudo mata fechada, sem ruas e com pouquíssimas casas.
 Havia um pedaço de clareira desmatada por Manoel Alves de Ataíde, o fundador da cidade, e lotes à venda. Em volta da clareira era tudo floresta virgem, cheia de imensas árvores e tabocas, e havia bichos como onças rondando. Para espantá-los, o senhor Ataíde fazia uma imensa fogueira e estourava bombas.
Seu pai e seu tio compraram duas datas de Manoel Alves de Ataíde, na Rua do Comércio, atual Nove de julho, onde hoje estão instaladas a Loja de Marcos Calçados e a Tipografia Alves do nosso amigo Paulinho. Construíram no local, casas de barro, e mais tarde transformaram-nas em casas de tijolos.
Misael Leandro Alves trabalhou um tempo na Serraria de Belmiro Jesus, ali nas proximidades do Nilton Supermercados, na Rafael Pereira. Ao construir sua casa, porém, instalou num anexo o seu Salão de Barbearia, e começou o ofício de barbeiro. E a dona Ernestina sua esposa fazia rendas de bilro, que havia aprendido lá no Norte.
          
Com 19 anos de idade, Severina casou-se com Benedito Santos, que viera com o irmão Porfírio da cidade de Colina. Porfírio era lenheiro e Benedito tinha uma Alfaiataria, onde hoje existe a Padaria do Antonio, na Rafael Pereira. Porfírio foi o primeiro taxista da cidade.
Dona Severina se encantou com o Benedito, que ficou conhecido como Ditão na praça. Era um homem negro, alto, vaidoso e muito elegante em seus ternos de linho branco, que ela passava com esmero, usando ferro de brasa.
Quando se casaram, dona Severina e o senhor Benedito foram morar numa casa de tábuas, na esquina da Rua Nove de julho com a Domingues de Souza, onde hoje está o Bar do Rosalem. Para ajudar no orçamento familiar, dona Severina lavava e engomava ternos, que eram roupas de uso do cotidiano na época. Ela tinha clientela fixa, porque o marido confeccionava ternos e ela zelava deles.
 Com o casamento vieram os filhos: Ana Edite, cujo parto foi realizado pelo Dr. Frederico Freires em casa mesmo, porque não havia hospital; a Valdeíte Inês, que também nasceu em casa sob os cuidados da famosa Parteira dona Júlia Cabrini; e o Vanderley que nasceu na Maternidade Santa Terezinha, sob a assistência de Dr. Macoto Ono. Ana Edite viria a falecer  alguns anos depois.
No dia sete de março de 1950, foi instalado o Ginásio Estadual de Mirandópolis, que teve início como Escola Normal Municipal de Mirandópolis, lá atrás da linha, na Avenida Dr. Raul da Cunha Bueno.

O senhor Savero Tramonte, que era Vereador na época, e cliente de dona Severina na lavagem de ternos, indicou-a para trabalhar no Ginásio como faxineira. Também começou na mesma função o senhor Sílvio Marchi.  A dona Terezinha e o senhor Jorge Cury foram designados Inspetores de Alunos.
 O Diretor provisório era o senhor Neif Mustafa, até a chegada do Diretor efetivo, Pedro Perotti Neto, que veio de São José dos Campos. Então, o senhor Neif assumiu o cargo de Secretário da Escola, tendo como Escriturários Auxiliares, o senhor Benedito Paschoal e Wilson Monteiro.

Havia quatro salas de aulas, banheiros, pátio, salas da Direção e da Secretaria, além de uma pequena Biblioteca, que a dona Severina e o seu Sílvio Marchi tinham o dever de manter limpos. A escola funcionava de manhã e à tarde. Por anos, o Ginásio funcionou ali, mas a população cresceu e aumentou o número de alunos, mesmo porque vinham ainda, muitos estudantes de Lavínia e de Guaraçaí.
Dessa época, dona Severina se lembra dos professores: Júlio Mazzei de Educação Física, Dalva Monteiro Colaferro de Geografia, Francisco de Assis Neves de Latim, Maria Ernestina Barbosa de História, Dirce Jodas Gardel de Português, dona Florinda de Francês, Carlos Roberto de Pádua de Desenho, dona Sílvia Ferraz de Abreu de Trabalhos Manuais e de dona Rhada, que fez uma belíssima demonstração de Ginástica Rítmica com as alunas da escola, no antigo campo de beisebol do Clube Nipo.

Lembra também de alguns alunos como: Carlos de Sylos, Edna Galvani, Nilton Orsi, Angélica Giometti e Juracy Carvalho, ambos de Lavínia, Zenaide e Zenilde Eid, Junichi da Aliança, João e Seimi Sadano, Neusinha Leite e Silvina Viana. Sobre esta, ela se lembra que a mãe foi pedir ajuda para o Diretor Perotti, para que ela pudesse estudar, pois não tinha condições de mantê-la na escola. Seu Perotti autorizou as irmãs Silvina e Rachel a prestarem os exames de Admissão ao Ginásio, e a Silvina passou em primeiro lugar.
Com a assistência da Caixa Escolar elas puderam estudar. A Silvina seria uma competente Professora de Português, justificando o investimento  e atuando na Escola em que estudou.     
Dona Severina se lembra do dia que a dona Noêmia chegou para dar aulas no CENE. Ao ser apresentada ao Diretor Pedro Perotti, ficou muito impressionada pela beleza e finesse do Perotti. Acabou terminando um noivado anterior, para se casar com o Diretor da escola.
Em 1961, o Ginásio se transferiu para o novo prédio, onde está o CENE até os dias de hoje. Havia oito salas de aulas, e passou a funcionar em três períodos: manhã, tarde e noite. Também foram nomeados mais faxineiros: seu Zezé e Cruz Martins, além do Inspetor de Alunos Valter e o Secretário passou a ser Abílio Candil.   
                           
 Além do Curso Normal para Formação de Professores Primários, que foi encampado pelo Estado, passou a funcionar também o Curso Colegial em duas modalidades: o Científico e o Clássico.
Como o funcionamento abrangia o período noturno, dona Severina também teve que trabalhar à noite. Lembra que tinha que deixar as salas limpas, para as aulas do dia seguinte. E até deixar tudo em ordem passava da meia noite, mas o seu marido Benedito ia buscá-la, e muitas vezes ele acabava ajudando-a.
Dessa época, dona Severina se lembra dos professores: Antonio Sanvito, Kazuo Kawamoto, Toshio Suguisaka, dona Helga, dona Irene Jacobs, Valter Teixeira, Walter Victor Sperandio, dona Celina, Lucy e Odair Dornellas, Joaquim Pompílio, Gabriel Tarcizzo Carbello e Jorge Chain Rezeke.
De alunos tem uma lembrança engraçada do Zapata. Ele lhe pedia para deixá-lo na sala de aula durante o recreio: “Pelo amor de Deus, dona Severina me deixa ficar aqui, para ver se a desgraça da Matemática entra na minha cabeça!” Naqueles tempos, os alunos eram muito preocupados com o rendimento escolar. Mas pelas normas da Escola, não podiam permanecer na sala de aulas durante o Recreio.  E o Perotti era inflexível.
Lembra também do Antonelli Antonio Secanho, que era muito estudioso e mais tarde seria Promotor Público. Dona Severina diz que os alunos eram muito educados e atenciosos e nunca teve problemas com eles, durante os trinta e dois anos que varreu e limpou as dependências da escola, para que o ensino ocorresse confortavelmente para todos.
Além da função de Servente, dona Severina administrou também a Cantina do CENE, durante um certo tempo.
Nas comemorações do Dia das Mães havia festa na escola toda, comandada sempre com muito entusiasmo pela dona Noêmia. E no Dia dos Professores, os alunos sabiam homenagear os professores, com muita festa.
Era um tempo bom, pois havia muito respeito e cordialidade.

Quanto à família, diz que ficou bastante orgulhosa quando a filha Valdeíte se formou Professora, e ficou muito feliz quando nasceram os netos e bisnetos. Só lamenta que o filho Vanderley não tenha estudado, pois desde cedo optou pela carreira de jogador de futebol.
A partir dos dezesseis anos, o filho passou a ser jogador, e como tal jogou em times famosos como: Comercial de Ribeirão Preto, Bangu do Rio de Janeiro, Atlético de Curitiba, XV de Jaú, XV de Piracicaba, Juventus, Misto de Cuiabá, Penapolense, Ipiranga da Bahia, Sergipe Esporte Clube, Corinthians Esporte Clube, Portuguesa de Desportos. Quando jogava no Juventus esteve no Japão e na Europa. Esteve também no Japão como Técnico do XV de Jaú.
 Toda vez que ele jogava, dona Severina ficava em casa torcendo por ele. Após parar de jogar, Vanderley trabalhou um tempo como Técnico, e atualmente está aposentado, mas sempre envolvido com o futebol à cata de talentos.
Seu Ditão faleceu em 1993, com 77 anos de idade. Nessa época já não era alfaiate, porque apareceram as roupas prontas nas lojas, e a moda era outra. Passou a fazer Corretagem de carros, fazendas e casas.  Fez muitas transações com gente de posses da cidade. Para dona Severina foi um bom companheiro.
Do seu tempo de juventude ela lembra que dançou muito e, seus parceiros foram Alcino Nogueira de Sylos, Elias Alagoano e José Silvino, de quem foi  muito apaixonada antes de conhecer o seu marido.
Lembra também que seu pai ajudou a desmatar a redondeza para construir o Estádio Municipal, a Estação Ferroviária e o Cemitério local. Lembra que o primeiro enterro foi do menino Raimundo de oito anos, filho de Fortunato Vieira.
 A amiga mais querida foi a senhora Floripes, que era costureira, mãe do nosso amigo Ademar Bispo. Também foi amiga de Anésia do Edézio. Lembra com saudades das festas de São João, promovidas pelo fundador Manoel Ataíde, que fazia uma imensa fogueira e todo mundo participava.
Ainda tem uma comovente lembrança do seu Manoel Alves de Ataíde. Quando o fundador morava sozinho, perto da Escola Dr. Edgar, dona Severina levava o almoço de Natal para ele. Ele já estava velho, pobre e sozinho, ele que fora o fundador de nossa cidade, a que inicialmente chamou de São João da Saudade.
Conheceu Dr. Massayuki Otsuki, Dr. Edgar Raimundo da Costa, suas esposas e muita gente mais.
Agora aposentada, passa um tempo com a filha Valdeíte e o genro Lupércio (filho do saudoso Professor Durval Nery Palhares) em São Paulo, e outro tempo com a nora Vera e o filho Vanderley, em Mirandópolis.
Sua nora Vera Lúcia Rodrigues (a popular Verona) natural de Ribeirão Preto está aposentada como funcionária da Prefeitura, onde trabalhou na área da Saúde.
Devido aos longos anos varrendo as salas de aula, dona Severina adquiriu bursite e problemas na coluna, que dificultam seus movimentos, e por causa da idade não sai mais sozinha. Mas, leva a vida numa boa, de bem com todos e relembrando o passado com saudades. A maior alegria de dona Severina agora é estar perto dos netos e bisnetos.

Dona Severina, peregrina do Nordeste brasileiro, veio menina e acampou em Mirandópolis. Aqui pelejou e construiu sua vida e sua história, participando da vida de milhares de jovens, que passaram pela Escola Noêmia Dias Perotti.
Hoje com noventa e dois anos se tornou memória viva da cidade.                                                                                                                                                                                                          Memória fabulosa!

Mirandópolis, 27 de novembro de 2012.
Kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

 Legenda de fotos:
1.     Severina fantasiada para o Carnaval,
2.     O povoado de Mirandópolis em 1939,
3.      Casamento de Severina com o Benedito Santos em 1940,
4.  O antigo Ginásio com professores e alunos,
5.  Professores do antigo Ginásio, dentre os quais se destaca o Diretor Pedro Perotti Neto, o Secretário Neif Mustafa, o Professor Júlio Mazzei e o Inspetor de Alunos Jorge Cury,
6.     Ginástica Rítmica pela Profª Rhada,
7.     Professores e Funcionários do CENE, dentre os quais, o prof. Valter Teixeira, Walter Sperandio, Zezé Franco, dona Terezinha, Izaura, Sílvio Marchi, Joaquim Pompílio, Romualdo Galvani, Tokiko Yamamoto, Marly Queiroz, Irene Jacobs, Jorge Chain Rezeke, seu Zezé e no centro a própria dona Severina,
8.     Com a nora Vera Lúcia,
9.     Severina Alves dos Santos.